terça-feira, 30 de junho de 2015

Uma ida, ida sem volta

Essas coisas de paixonite passa... Passa. Minha mãe sempre me dizia sobre isso. Falava que quando a gente crescia, virava gente grande... sempre ia encontrar alguém. Mas na minha mente de criança, nunca me passou pela cabeça que esse "encontrar", seria encontrar no metrô, na rua, na escada, na sala de aula.
Eu sempre imaginei aquela coisa meio Cinderella perdendo o sapatinho de cristal escada abaixo. O único problema foi que o único objeto de cristal que perdi foi o meu próprio coração que, além de lapidado, foi estraçalhado: diversas vezes; de distintas formas.
Nunca consegui encontrar alguém. Aliás: até encontrei, mas não da forma como minha mãe dizia. Eu sempre fui muito desastrada, diga-se de passagem; nunca consegui encontrar alguém assim... aleatoriamente. Só encontrava esbarrando, tropeçando. Caindo. 
Em inglês o verbo cair é conjugado na forma "to fall". Já escrevi sobre isso, algumas vezes... porque "fall"... falir, em português, super significa se deixar "entrar na vala", na falência, na morte, na obscuridade, na tristeza, na fossa. 
No caminho. Caminho de passagem só de ida para a tristeza. Passagem de ida, de ida sem volta. E cá estou eu mais uma vez escrevendo sobre a porcaria de esbarrar mais uma vez e sempre na mesma pessoa, aquela que você sente, acha. Acha e acha que vê que vai ser a pessoa da sua vida e daí chega a porra do metrô: e você pega ele e vai parar em Montmartre ou Gare du Norde... e se fode. Se fode.
Se fode sozinho: na vida, na fossa, na vala, na caída, no abismo e no metrô. No metrô de uma passagem de ida. De ida sem volta.


quarta-feira, 29 de abril de 2015

Fall (ida) in Love - Parte 3

Antes de sair declarando todas as coisas coloridas que se passavam em minha mente e de contar sobre todas aquelas milhares de borboletas que estavam "zanzando" no meu estômago e; obviamente; todas aquelas outras - e tantas! - sensações orgásticas inefáveis que eu sentia todas as vezes que pensava ou que O via, eu deveria saber que as coisas - nessa vida real que a gente leva ou empurra - não acontecem como em textos como este: em que eu posso idealizar cada vírgula que é disposta nesta folha de papel.
"Idealizar: v.t.d e v.pron. Projetar ou projetar-se de modo ideal; imaginar alguém de maneira perfeita: idealizar um personagem, um modelo. V.t.d e v.bit. Fantasiar; conceber de modo imaginativo; criar na imaginação. V.t.d. Elaborar a planta ou o plano de; planejar, conceber." Bom, já deu para entender...
(...)

Quando você idealiza muito a subida de um balão de festa junina é bom tomar cuidado: quando ele cair pode queimar muitas casas, quintais, ruas... E ainda fazer com que você seja preso!
Essa coisa de cair, de 'fall'... Já contei que sempre fui uma desastrada? Sempre derrubei coisas, caí bastante, tropecei em diversos lugares e; quando adolescente; cheguei a quebrar mais copos e pratos da minha mãe do que eu pudera imaginar. Ainda bem que só eram pratos. E copos. E isso, meu bem, tem conserto: é só comprar outros novinhos na loja.
Eu sempre caí bastante com os tropeços desta vida e aprendi muito; acredite; até quebrando as tais louças da minha mãe. Acontece que o coração da gente não é como louça e não dá para ir em uma loja de um e noventa e nove; ou em uma daquelas bem caras; e comprar outro. Não, não dá. E isso é o que mais me incomoda.
(...)
Outro dia resolvi dar o meu coração...(eu poderia tê-lo vendido - dessa forma, talvez, ainda pudesse obter algum lucro - mas não: eu dei). Sim! Dei assim "de bandeja", como dizem por aí. Dizem que tudo se torna mais incrível e excitante quando roubam o nosso coração, mas eu achando que estava sendo esperta, recebi dá-lo de presente. Tão ingênua eu!

Fato é que, no meio disso tudo, eu gastei muito esforço e tempo tentando pegar meu coração de volta. Mas creio que ele gostou bastante de ter ficado lá onde ele está: talvez isso faça com que eu evite de deixá-lo ser quebrado, como as louças da minha mãe, uma vez mais. (Já que só há um pedacinho dele inteiro, porque o resto se foi). 
Quereria eu poder comprar outro coração destes novinhos em folha que a gente vê em novela, ou em contos de fadas ou em crônicas fatídicas como esta que eu escrevo agora. Eu dei - e perdi - mais que um coração. Eu fall... fali. Fali totalmente in love. Por outro ângulo, isso me rendeu alguma coisa, além desta imensa vontade de fall, de cair... e não mais levantar.

Allivád Snitram (c) São Carlos, São Paulo, Brasil - 11:25 hrs 29.04.2015


terça-feira, 21 de abril de 2015

O mar dos teus olhos

Dedico para você que me faz viver um mar azul de sensações. 

Com amor.

Ao J.

Querido Diário,


É sempre muito difícil falar "eu te amo". Na verdade, difícil, difícil, não é... mas as pessoas complicam isso o tempo todo. Seria tão mais simples se pudéssemos dizer o que sentimos sem esperar o mesmo em troca ou sem se preocupar se a pessoa vai ficar assustada, sem reação, espantada, perplexa ou feliz. Isso: feliz. Vejam só... eu disse: até mesmo feliz.
Sim! Porque a Felicidade é uma coisa muito rara hoje, muito abstrata. Conceitual. Na realidade, sempre foi. Ou, lá não sei eu, nunca nem existiu. Para falar a verdade, ela é o ingrediente mágico que falta na vida de cada ser humano que nasce e que vive na busca eterna, incansável e fatídica de ferramentas para encontrá-la.
A principal ferramenta para a Felicidade é, justamente, poder identificar-se através do outro, do "conhecer" o outro, pois é desde este detalhe, mínimo talvez, que crescemos enquanto indivíduos e podemos nos reconhecer enquanto a verdadeira essência do que somos. A partir daí, nos tornamos aptos e imersos no conhecimento mais profundo acerca de nós mesmos.
Eu sempre fui de falar "eu te amo" a torto e a direito para as pessoas que eu re-a-l-men-te amo. Sou assim: espontânea, sem escrúpulos e penso que não há porque não falar o que eu sinto, quando eu sinto, para as pessoas pelas quais eu tenho algo que sei que sinto.
Bom, você entendeu: no final das contas, não é só falar - gestos também dizem muito; mais até que as famosas palavras; e as vezes, para você dizer que ama, nem precisa verbalizar: pode parecer clichê, mas apenas um olhar já é capaz de passar toda essa energia desse sentimento tão benigno que é esse tal de Amor.

Bom... mas voltando ao tópico do "verbalizar"o sentimento, vou lhes contar o que me passou outro dia. Como eu disse, sempre falei muito que amava para quem eu amava e quando eu amava. Mas ontem, especificamente ontem, eu vivi a experiência de dizer o primeiro "eu te amo" para uma pessoa que não é meu irmão, nem meu pai, nem minha mãe, nem meus amigos (que a propósito, ouvem isso regularmente de mim), nem a Sofia (minha cachorra). Mas como foi a primeira pessoa, neste sentido e dentro deste contexto tão (e completamente) novo para mim, confesso que não soube mesmo o que fazer.
As palavras saíram naturalmente, segmentadas, ao mesmo tempo (apesar da dicotomia) por um triângulo que os meus olhos faziam enquanto eram direcionados neste sentido: da boca dele para o olho esquerdo, do olho esquerdo para o olho direito e do olho direito para a boca, fiz isso umas três vezes, rápidas, mas que no meu subconsciente demoraram uma vida para acontecer.
Foi tão simples, tão enaltecedor dizer aquilo. Me senti a pessoa mais leve do universo - tanto que poderia muito bem ter virado esse pedaço de papel e ter voado por aí com a menor brisa que houvesse - e; para além de tudo: muito, muitíssimo e extremamente feliz.
Eros e os seus encantamentos. O problema é que me apaixonei pelo filho de Poseidon e eu não sabia nadar. Na verdade, nunca fui muito fã de mar e navios e todas essas coisas que envolvem elementos marítimos. E, um grande problema; não para mim; mas creio que para ele... é que ele queria viver em uma ilha. Uma ilha só dele e creio que ali não havia mesmo lugar para uma pessoa como eu: expansiva, espontânea, sem escrúpulos e nem para o cara que insistia; naquele momento; em me acompanhar: O Amor.
É... esse parágrafo compridão foi tudo o que eu pensei enquanto fazia aquele triângulo lá, com o olhar. E uma lembrança que não sai mesmo da cabeça, fico remoendo isso e já faz 24 horas: ele não disse nada e eu também, sinceramente, não esperei que dissesse, pois como eu disse, eu não faço e nem digo as coisas esperando receber na mesma moeda. A vida seria muito pacata e sem graça se fosse assim.
Ele me olhou, fez exatamente o mesmo movimento em relação à mim, aquele lá... do triângulo com os olhos; passou a mão por sobre a tez da superfície fria (quase congelada de nervosismo) da pele da minha bochecha direita, me olhou bem no fundo dos olhos - quase pensei que ele veria minha alma daquele jeito, eu hein?! - e... não disse nada. Nada. Nadinha.
NADA, gente!
Bom... aí eu fiquei sem graça porque me senti uma completa patética que além de ter acabado de declarar oficialmente o que estava sentindo, ainda estava ali: no meio do mar; que eram aqueles olhos azuis; sem barco com ou sem vela, começando a me afogar.
Fechei os olhos enquanto ele me dava um beijo também. Quando eu abri, continuei olhando para ele em silêncio. Ele também me olhou. Ficamos assim um bom tempo, três minutos, talvez. Me beijou na face, depois me abraçou, me olhou de novo e veio novamente em minha direção... dessa vez, em um beijo terno, sutil, porém demorado. No meio do beijo, eu abri meus olhos - aliás... você já se perguntou porque a gente fecha os olhos quando beijamos? Eu sempre me questiono sobre isso... deve ser porque a gente fica parecendo peixe, se beijar com os olhos abertos... bom, sei lá. 
E quando eu abri, vi que ele, enquanto me beijava, sorria também. Eu comecei a sorrir e, de repente, estávamos os dois lá: rindo sobre nada, juntos no mesmo barco indo talvez para aquela ilha - ou não, mas isso agora já não importava - e sim: acompanhados pelo Amor.
Ele não disse e também não precisa dizer. O que importa é o que eu sinto e, enquanto isso me fizer bem, acredito que devo e lutarei para continuar sentindo. Agora estávamos ali, no meio daquele oceano azul, juntos, unidos e se eu tivesse que nadar ou navegar para chegar naquela ilha... por quê não? Já não dizia Pêssoa que navegar é mesmo preciso e que viver nem sempre é assim? Deixo essa pergunta para vocês responderem, já que preciso voltar para dar um final para essa nova história. É... o amor tem várias formas. Talvez dessa vez eu deva mesmo me afogar.

Maria Clara,
Paris, 31 de dezembro de 1992.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

O meu reflexo que é você

Era um espelho apenas, o qual refletia toda uma realidade que estava escondida bem lá no íntimo de um passado não muito distante. O espelho que nos dizia todas as noites, após alguns minutos de deleite, o que éramos: claro que só exteriormente, uma vez que espelhos comuns não tem o poder de ver mais adentro. No entanto, o que me deixa mais aflita, é que agora percebo que aquele nunca fora um espelho comum.
Era um espelho simples. Refletia tudo, como todos os outros, ou... quase tudo, penso agora. Era quadrado e disposto em uma das quatro paredes daquele minúsculo lugar. Não tinha moldura, mas podia muito bem funcionar como um retrato: era o que acontecia, quando nós resolvíamos permanecer diante daquele objeto, diga-se de passagem: mágico. Aquele espelho emoldurava nossos corpos nus, entrelaçados e parados de uma forma que fugia ao natural. Eram dois corpos: um olhando para o outro, ou não. 

Costumávamos ficar ali por alguns minutos: parados, abraçados, pensativos. Como se a força de ambos dependesse decididamente, um do outro. O que não era muito, mas era o que tínhamos: força. Sim! Éramos muito fortes, todavia, sempre pensávamos que os fortes eram os que contribuíam para nossa infelicidade: não era verdade. Mas, naquela época, ainda não dávamos conta disso.
O outro corpo, não conseguia pensar. Não era qualificado o suficiente para isso... tão hipócrita, ingênuo e infantil, mas além disso podia ser alto ou baixo, dependendo do olhar que eu lançava sobre ele. Pelo menos ele podia ser vários ao longo de um período e, ainda assim, continuar com toda aquela essência. O meu corpo, por outro lado, ao se deparar com aquele, se sentia só; apesar de haver uma incrível e tão harmoniosa conexão entre os dois. Eu me sentia uma formiga, uma formiga longe da sua própia sociedade e logo, por isso: uma formiga perdida. Eu havia me perdido naquele abismo, me afogado naquele mar... no abismo que era a cor dos meus olhos negros e no mar daquele azul sem fim refletidos tão perfeitamente no espelho: em noites sem lua, em noites sem festas, em noites comuns.
Eu permanecia em devaneios por minutos, horas até. E o outro corpo, me acompanhava em tudo, talvez não na mesma linha de pensamento, mas decerto sempre estava ali: presente, bem junto à mim. Creio que se eu o perdesse, enlouqueceria e chegaria até, a perder a minha própria alma. E apesar dele ser tão ingênuo, creio que sem aquele outro corpo comigo eu não seria capaz de ter um raciocínio lógico, tão lógico assim.
Em minhas crises existenciais de "Ser ou não ser", ele sempre se mantivera ao meu lado, assim como o espelho, dependendo do ângulo. Ele sabia o que eu passara até ali e estou certa que sempre torcia para que eu não sentisse muita dor, porque senão: ele fingiria sentir também. Sim! Aquele sabia ser um fingidor, fingia sobre tudo, sobre todas as coisas. Era o seu maior dom, e às vezes, eu me sentia mal por isso. Mas não tinha do que reclamar, afinal de contas, ele jamais hesitara em ir à qualquer lugar que eu fosse, ou fazer tudo o que eu almejava fazer. Com toda a certeza, era o meu companheiro para tudo.
"Espelho, espelho meu... " era o que nós dois fazíamos depois de ficarmos deitados, um sobre o outro, na cama. O espelho era o nosso refúgio: gostávamos - e muito - dele. E como gostávamos! Podíamos ser quem quereríamos ser entre aquelas quatro paredes e o espelho? Ah... uma mera testemunha. Sofríamos bastante com aquele amor, mas gostávamos dele. Não dizem por aí que o sofrimento é opcional? Pois gostávamos desta opção. Foi uma opção minha e daquele outro corpo: sofrer. Se tivéssemos que sofrer, sofreríamos juntos então.
No entanto, eu como ser pensante, às vezes paro e imagino: será que ainda levo muito tempo a fazer tudo isso com ele? Ou será que este corpo também desistirá de mim? Não. Decididamente, ele não pode fazer isso comigo. Nunca poderá e não o fará. Porque sombras, acompanham-nos onde nós queremos, e fazem o que queremos fazer. Apesar de serem fingidoras a maior parte do tempo, podem ser os mais sinceros corpos.
Só fico a pensar, se até o fim de meus dias, acabarei assim: eu, ele: o outro corpo; que é minha sombra; e o espelho.

quarta-feira, 18 de março de 2015

Fall (indo) in love II

Na verdade eu nem sabia o que fazer. Eu só estava ali: pronta pra ele. Pronta para qualquer tipo de indagação, ou olhar, ou abraço ou um daqueles beijos no rosto inesperados que a gente espera sem vírgula, sem ponto, sem reação. Falida, falindo, fall (indo) in love.
(...)
Ele não fez nada. Apenas pediu um drink para a garçonete, me olhou - como em um pedido de aprovação; e eu... eu como em uma resposta silenciosa de um "sim", apenas mexi a cabeça, como mais uma forma de aprovação.
Dois whiskeys com gelo e limão. Olhei bem para aquilo e pensei "estamos mesmo onde?"; super queria uma caipirinha, ou uma água de côco ou apenas água mesmo.
Eu olhei bem no fundo daqueles olhos tão transparentes e azuis quanto o mar mediterrâneo e depois para aqueles lábios tão rosados quanto os lagos da Austrália ocidental e eu sabia: eu sabia que ele era e que era ele. Ele.
Nos beijamos: uma, duas, três vezes.
Em um desses beijos eu me afoguei, confesso. Mas eu já sabia: estava em um mar, um mar de emoções, um mar desconhecido. O mar que ele era ou que era ele.
Nós dois.
(...)
Nos amamos. Talvez como Afrodite e Poseidon e numa mistura afrodisíaca de sabores e sensações, nos embriagamos e acabamos conhecendo Baco e terminamos em um meio, um meio... meio que sem fim. Assim...

(Continua...)

quarta-feira, 11 de março de 2015

To fall in love

Existe cerca de mais ou menos 8 bilhões de pessoas no mundo e você tem o azar - ou a sorte - de se apaixonar apenas por uma. Por uma! Uma de cada vez, ou de tempos em tempos, ou nunca. Ou de se apaixonar por várias ao mesmo tempo e diversas vezes, mas sempre gostar mais de uma do que das outras. Ou não e eu posso estar errada. Mas... o fato é simples: eu sou assim. Tenho o poder de me apaixonar repetidas vezes por diferentes pessoas, ou de me apaixonar repetidas vezes por apenas uma delas. Ou os dois. Por outro lado, eu achava que só tinha um deles: o de me apaixonar por várias e repetidas vezes por pessoas diferentes e nenhuma delas ter a virtude da reciprocidade... até Ele aparecer.
Como eu ia dizendo sobre o tanto de pessoas no mundo: você tem uma chance quase nula de encontrar, perdida por aí, sua alma gêmea. Ou a chance incrível de ela poder te ajudar a encontrar o que pode haver de melhor em você. Ou os dois, mais uma vez. Isso soa meio prolixo (mas a vida é prolixa então creio que não há problema algum em eu ser também), neste exato momento.

Continuando... eu estava em uma festa, dessas que todo mundo parece estar em uma daquelas alucinógenas festas em Ibiza, ou em Miami Beach ou na sala de suas próprias casas, porque o que menos importa para estas pessoas é o lugar: contanto que haja algum tipo de elixir que as faça sair da órbita sóbria da terra, ou qualquer outra coisa que as pessoas intitulem como "estar são".
(...)
Havia muitas estrelas no céu e a lua brilhava bastante. Lembro perfeitamente disto, porque ainda tenho dessas coisas de olhar para o céu antes de dar o primeiro gole proveniente do meu copo. A propósito, ultimamente o meu copo é o único que alcança os meus lábios. Ou pelo menos era o que costumava acontecer... até então.
Bom... eu estava lá, ele também. A gente só não sabia disso, não ainda. Conversei com os meus amigos, tiramos fotos, rimos e falamos mal da festa (estava um lixo). Começou a ficar mais frio do que já estava. Estávamos em um pub, em Montmartre, não me lembro a rua. O feixe de luz proveniente do topo da Eiffel, iluminava de quando em vez, toda a cidade. Eu já não acreditava nessa coisa de paixão, ou de amor ou do raio que o parta. Sabe como é: quando você vive na capital do romantismo, você acaba ou amando a ideia de "poder amar" ou odiando tudo isso. Que foi o que aconteceu comigo, depois de tantas experiências falidas nesse tal de "fall in love". Fallida in love. Como eu costumo dizer.
Resolvi que iria embora, eu precisava ir para a faculdade no dia seguinte e ter saído, definitivamente, não fora uma boa ideia. Disse um adeus breve para todos os meus amigos e combinei com eles que falaríamos no dia seguinte, via Facebook. Peguei minha bolsa e o casaco e me dirigi até a porta. Meio não-sóbria, abri a porta do bar e saí. Peguei um cigarro e acendi - ainda estava muito frio, apesar de eu estar usando tantos casacos.
Na minha primeira tragada, um garoto de olhos bem azuis; tão azuis quanto o fundo de uma praia deserta e serena do Hawaii; me disse boa noite e perguntou se eu tinha um cigarro para lhe dar. Eu respondi um "é claro", bem polido e continuei parada, fumando. O meu coração acelerou e minha respiração ficou ofegante. Sinceramente: eu não sabia o que fazer, então... eu só não fiz coisa alguma. Fiquei ali. 
Pela minha visão periférica percebi que ele continuava me olhando, agora um pouco mais distante, pois ele percebeu que havia invadido o meu espaço. Ele devia estar pensando isso, porque eu, na verdade, havia adorado tudo aquilo.
- Você quer fogo? - perguntei, tremendo por dentro. Primeiro de frio, depois de ansiedade, medo, vergonha. Sei lá.
- Oui. - respondeu ele, aparentemente muito interessado em tudo aquilo.
Pegou o isqueiro e acendeu o cigarro. Silêncio de novo.
- Bom... eu preciso ir. Boa noite! - eu falei apressada, querendo fugir de mais uma Fallida in love.
Nos olhamos e eu fiquei parecendo uma pateta perdida na Disneyworld daqueles olhos azuis. Congelei naquele momento: talvez fosse culpa do frio, ou do frio dentro da minha barriga ou porque eu sou mesmo completamente idiota e romântica e acho que qualquer cena cotidiana pode virar capítulo de um livro.
Ele disse um "Espera, vamos tomar mais um drink" e eu não disse nada, continuei ali parada, congelada, apaixonada. Fallida in love.
Ele me estendeu a mão e me olhou no fundo dos meus olhos; pretos como abismo; e eu olhei para os olhos dele: tão azuis quanto o mar.
Eu não queria me afogar, mas tentativas são sempre bem-vindas. Eu estava pronta (ou pelo menos achava que estava). Estendi minha mão para ele e entramos no bar.

(Continua...)


sábado, 14 de fevereiro de 2015

Borboletas

"As borboletas voltaram."
Foi exatamente o que pensei, quando um frio gélido na minha barriga começou a ser direcionado rumo ao coração.
Estava frio. Muito frio, até.
Encostei meus dedos sobre a superfície fina, rendada, fria de uma cortina velha que cobria a visão da minha janela, que dava diretamente para as flores do jardim. Estava infestado delas: diversas cores, tamanhos e energia.
Engoli em seco: ao olhar por aquela armação de madeira velha, a qual constituía uma vasta janela sem sacada, uma daquelas borboletas direcionou minha visão para Ele, que acabara de atravessar a rua em sua forma elegantemente desengonçada de andar.
Fechei a cortina. Respirei fundo. Tremi.
"Ai meu Deus" - pensei.
Naquele momento; creio que fechei para além de uma cortina literal. Eu, decididamente, não queria ver borboletas. Na verdade... até queria, mas no geral, não costumava me dar bem com elas: como se já não bastasse me causarem alergias, ainda ousavam me alimentar com aquela ilusória paixão, que há poucos segundos havia entrado meio cambaleante em um táxi.
Sem dúvida alguma, eu não estava pronta para borboletas. Não queria vê-las. Não as queria mais ali. Ainda mais quando elas insistiam, para além do jardim, invadirem a privacidade do meu estômago.

(...)

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Asma

O problema - ou um dos grandes problemas - de uma grande paixão aterradora funciona mais ou menos como asma: prende sua respiração e até te atrapalha muitas vezes, mas você é viciado em fumar e não consegue sobreviver sem aquilo, culminando no agravamento da doença. Digamos então que a paixão é a sua asma, você não vive sem; o cigarro é a pessoa pela qual você se apaixonou e sua asma é o obstáculo que te impede de chegar no objeto alvo: o cigarro. Logo, a sua asma te impede de fumar, de estar ali com a pessoa pela qual você foi abaixo: o tal do "fall in love". Mas você insiste em fumar e isto só agrava mais a sua saúde.
(...)
Tem certas coisas na vida, que é melhor não fazer ou nunca ter o prazer de provar, de sentir, de viver. Maria Clara sofria de asma. Quando criança tinha muitos ataques e como ela adorava quando Israel, seu pai, a levava para a beira do lago para que ela tentasse respirar melhor! Mas isso era quando ela ainda fora uma criança, ainda quando o seu pai estava vivo. Agora, a sua asma havia voltado: em uma crise maior, que lhe afetava diretamente - além dos pulmões - a mente. E o coração. E Israel já não estava mais ali para levá-la para um ponto de refúgio, de libertação. Quando criança seu pai fora o homem da sua vida, mas depois de sua morte, no período da adolescência de Clara, logo depois surgiu um outro. Ele se chamava Gustavo.
Ela ficava tempos sem vê-lo, mas quando o destino se encarregava de colocá-los lado a lado ou frente a frente, todas as memórias, sensações e lembranças voltavam. Voltavam como um tsuname, ou um tornado ou um abismo: característica tão marcantes dos olhos de Gustavo, pretos cor de abismo. Abismo. Tentação.
Se encontraram por outro acaso do destino. Se abraçaram como há muito não faziam. Um abraço tão apertado, que Clara perdeu o ar: primeiro, por conta da asma. Segundo, por azar de ter fumado. Terceiro, por tê-lo encontrado uma vez mais e ter a plena certeza que logo o perderia. Afinal, quando tragamos a fumaça, ela sobrevive um determinado tempo dentro da gente; às vezes em uma questão de segundos, e depois se esvai. Se tentarmos mantê-la em nossos pulmões, os estragamos e perdemos nossa força vital.Maria Clara sempre tivera que escolher e; uma vez mais, optou por deixar Gustavo ir embora. Sustentá-la por questão de segundos, como a fumaça que saíra de seus pulmões, e esvair-se no ar. Assim: tão livre.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Espelhos D'água

Geralmente água nos faz lembrar de coisas boas. Com exceção de chuva, que particularmente, remete a coisas tristes. Já reparou que em novelas e filmes, em momentos caóticos e de profunda tristeza ou de repentina mudança na vida do personagem, sempre chove? Então: é disso que eu estou falando. Mas no dia que aconteceu todas essas coisas que eu vou contar daqui a pouquinho, não chovia. Pelo contrário: fazia muito calor.
(...)
Nos conhecemos em um desses raros momentos em que, ao passar um ao lado do outro, damos a sorte (ou o azar, nunca se sabe) de, por coincidência ou destino, esbarrar um no outro. Eu curto essa coisa do olhar. Desde criança devo ter tido o meu olhar como algo muito marcante. Um professor do ensino fundamental me chamava de "Olhos de Jabuticaba", depois, na adolescência, fui descobrir que jabuticaba era uma fruta pretinha, redonda e um pouco azeda. Ao longo dos anos, creio que fui ficando azeda em muitos aspectos, mas todo esse azedume começou a sumir no momento em que os meus olhos de jabuticaba cruzaram com os olhos iguais a espelhos d'agua de um azul nítido e profundo daquele garoto.
Compartilhamos muita coisa ao longo do tempo. Uma amizade normal, terna e com o passar dos anos veio o distanciamento. Um dia; muito quente por sinal; o encontrei pela rua, mas já havia passado tanto tempo e tanta coisa havia acontecido que quase não o reconheci, por exceção dos olhos: tão azuis quanto o mar, tão cristalinos quanto água pura, dessas que não se encontra por aí... em qualquer torneira.
Por outro lado e apesar do calor, ele veio como uma chuva de verão aterradora, caótica e tempestuosa: destruiu tudo o que podia haver de bom em meu coração, corpo e mente. Algumas vezes, depois que longas chuvas caem, saio de casa e fico olhando as poças d'águas e me lembrando dos olhos dele. É como se eu pudesse me ver refletida naquela iris e, ainda assim, não ser mais a mesma.
Inspiração. Necessito de inspiração.

São Carlos, São Paulo, Brasil - 22.01.2015 17:30 hrs