segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Um sorriso no escuro


                                                                                                            Dedico ao Sobrenome Ferreira:
                                                                                                            Fonte de criação.



“É como se eu tivesse me separado dela - partindo daquela veroz idéia de que éramos dois corpos unidos - e começasse a costurar… consertar o pedaço de um tecido cortado, que outrora fora ligado por uma linha firme, forte. E agora não mais. Então decidi ser único de novo. Estou à caminho… mas é como se eu pudesse ser único e; ao mesmo tempo… precisasse inovar. Precisasse de um pedaço de tecido novo. De uma linha diferente, mais forte.
 Resistente.
Antes de dormir, a fumaça invadia meu quarto. Deitado, na cama, me sentia como Gregor Sansa, em seu processo de metamorfose. Me sentia um monstro… um homem elefante, humilhado e não aceito por uma sociedade inteira. Eu era ambicioso, valente. Estava ali por um acaso, como Peri em sua saga por Cecília… eu iria encontrá-la. Defendê-la.
Levá-la comigo.
Eu precisava de um tempo. Um tempo para reorganizar as coisas. Jogar fora o que não servia. Renovar minha vida.
Meu coração.
Fui dar uma volta ao redor do Tâmisa… as luzes de natal brilhavam como o reflexo das chamas das velas, que ela costumava colocar por sobre a mesa, em nossos românticos jantares à dois. O Big Ben badalava meia noite. Joguei o cigarro no chão, atravessei a rua; entrei em um café.
Sempre gostei de escrever, desde criança, lia sobre romances policiais como Sherlock Holmes e muitos sobre o Hercule Poirot, de Agatha Christie. Agora, eu estava ali: a investigar o passado da minha vida. Sozinho. No natal.
Pedi um café, fingi olhar para a TV e ver algo. Uma coisa não saía da minha cabeça… mas nem eu me dei conta do que era.
Acabei meu café, precisava de outro cigarro. O frio estava aterrador. Como eu precisava de calor. Estava devaneando, quando do outro lado da rua, vi uma garota sair. Não dava para ver muita coisa: sobretudo, um chapéu. Lábios de um vermelho intenso. Saiu do Táxi, acompanhado por dois homens. Atravessou a rua, me olhou.
E sorriu.
(…)
Sempre volto nesse mesmo café há exatos dois meses. E tudo o que lembro são daqueles lábios. E do sorriso… Quem disse que encontrar o pedaço do tal tecido é fácil, engana-se. Então, eu continuarei voltando e voltando nesse mesmo lugar, tomando os mesmos cafés e investigando o passado que é minha vida… Quando eu ver de novo aqueles olhos cor de âmbar e aquele sorriso de afrodite, escrevo um final para este capítulo.

Timotty Huts;

11 de janeiro de 1989"

Coimbra, Portugal. 30.10.2012; 01:01 A.M.

domingo, 21 de outubro de 2012

Abismo

Dedico à quem é capaz de amar apesar da distância. E desencontros.



"Carrego comigo o fantasma que é você, desde os meus 14 anos de idade. O que escrevo agora, foram acontecimentos, sonhos. E chego quase a certeza, que a maioria, nunca serão fatos. Resumo apenas em um desabafo atemporal que transcende... elimina; neste momento; qualquer partícula de orgulho que ainda possa existir em mim.
Seus olhos de um negro opaco, foi o que me inspirou a escrever um livro de exatas 336 páginas, escritas à mão em um caderno meio velho e empoeirado que sempre ficava escondido por baixo do meu colchão, na minha singela cama, naquele quarto um tanto sem luz. Eu o escrevi no curto período de um mês. Enquanto eu dormia, Morpheu inspirava-me para que assim que eu acordasse, eu pudesse ter a oportunidade de ver a beleza e ingenuidade em que você se transformava, à  medida em que minhas idéias, eram dispostas naquela folha abarrotada de papel.
Sensações utópicas e idealizadas, eram concretizadas ao longo daquelas linhas rotas.
Desbotadas.
O seu nome, no livro, foi o único que não fiz questão de mudar: queria você concreto.
Do nome, ao corpo.
Essência.
Prometemos um ao outro, que se um morresse antes do primeiro, o segundo estaria inconvictamente no funeral daquele. Bobagem! Adolescentes, sempre tendem a materializar idéias e expô-las de uma forma um tanto inadmíssivel. Você e eu, éramos como um comando "while", com bug: eternos em um looping eterno. E alternadamente, ínfimos. Daí o bug.
Você é um daqueles algoritimos ilógicos... se é que pode haver algum. Por isso, você não existe. É mais uma de minhas criações. Você nunca esteve aqui. Não estará e; começo a me convencer, de que eu já cansei do que poderia ser você.
 Do verdadeiro você.
Quero continuar te tendo idealizado, bem aqui... dentro da mente, do meu livro de 336 páginas que, com tanto esmero, eu escrevi. O meu desabafo que deveria ser um tanto quanto longo, termina; PARADOXALMENTE; sem um fim. Estou meio ocupada para continuar a desvendar-lhe a maior parte de meus segredos. Por isso, fecho agora este livro de trezentas e tantas páginas. O guardo no único lugar em que sei que é seguro, escuro e que ninguém vai mecher: embaixo do meu colchão, naquela cama singela em um quarto um tanto, como seus olhos: opaco.
Sem luz.

Coimbra, 21 de outubro de 2012 18:38 hrs.

terça-feira, 6 de março de 2012

Baco

"Ele sentou ao meu lado. Minha respiração descompassada demonstrava meu desconcerto em relação aquele corpo ali. Eu podia ver perfeitamente seu rosto de perfil: sua barba por fazer, o seu sorriso sutil e três marquinhas de expressão perto dos olhos quando ele se punha a sorrir. Um arranjo de face, em uma harmonia perfeita. Ele, no que diz respeito à padrões estéticos estereotipados, não podia ser designado como um ator hollywoodano, todavia; para mim, era simetricamente perfeito, uma vez que sua postura intelectual rica e espontânea, fazia-o parecer como ao deus do vinho, triplamente evoluído, pelo menos, para mim.
Ele me olhou. E sorriu.
A aula ficara em segundo plano, àquela altura.Já não me interessava o que o doutor estava a falar. Algo sobre política... penso eu. Na sala, longa e meio obscura, só havia eu. E ele. Pelo menos naquele instante, dentro de toda minha imaginação; em que minha mente se concentrava em materializar aquele olhar entre os meus; e idealizar um possível contato em que o meu corpo também pudesse sentir o calor daquele outro corpo e partilhar um pouco de toda aquela experiência metafísica e interior em segundos de execução.
Alguém estava a me desconcentrar. Um garoto que sentara-se atrás de mim, estava a me dar a folha de presenças e indicou que eu deveria dar à Ele. Eu parei no tempo. O coração acelerado, fazia um barulho: "tum-tum, tum-tum". Pensei que este, iria sair pela boca e que todas as pessoas ali presentes, ouviriam o seu "tum-tum-tar." Eu lhe estendi a folha, ele a pegou, me olhou. E sorriu.
Novamente.
E eu? ah! eu não fiz nada. Acho que retribui-lhe com um sorriso meio amargo, meio tolo, meio polido. Engoli em seco. Corei e abaixei a cabeça. Acho que isso decunciou à ele, tudo o que eu estava a sentir naqueles dois segundos em que as pontas dos meus dedos, se encontraram com as pontas dos dedos dele.
Eu nunca ficara tão encabulada com a presença de alguém. Mas aquele jeito todo intelectual, polido e espontâneo, despertava em mim algo paradoxal e esdruxulamente bom.
Eu precisava parar com aquilo. Morpheu estava a me encantar em seus sonhos, como sempre. E a me iludir mais uma vez. Eu quereria participar do manjar dos deuses no Olimpo, me embriagar no vinho de Baco e adormecer ao som da gaita de Morpheu. Quereria eu, provar o sabor peculiar de fruta, no sentido lato de sua criação, de sua significação. E essência. Baco, fizera renascer em mim, o amor pelas palavras novamente, e como em uma melodia mozartica, eu estava a me descobrir a teclar sem parar as letrinhas de um teclado, como há muito, não mais fizera. Ele, redespertara em mim, todas aquelas sensações orgásticas inefáveis, que seres humanos, meros mortais como eu, sofrem ao se apaixonarem mais e vez mais.
Baco e suas tão poderosas tentações. Conseguiria ele então, me drogar sem um pingo de vinho? Me vulnerabilizar, com apenas um olhar? Me deliciar com sua voz doce, a recitar-me poemas? Me levar ao àpice transcedental, com apenas um toque de seus lábios nos meus? Não sei. Mas ele, como à um deus grego, se quisesse, seria bem capaz de fazer tudo isso.
E muito mais."


Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Coimbra - Portugal.
19:45 Hrs.